SEJA BEM-VINDO!

BEM-VINDO AO MUNDO DA ESCRITA!

EIS AQUI O ESPAÇO VIRTUAL ONDE AS PALAVRAS BUSCAM SE LIBERTAR DO LIMBO.



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CAROS AMIGOS,

A CARA DO BLOG MUDOU, ENTRETANTO A AVENTURA DE ESCREVER CONTINUA VIVA.

ESTAMOS AQUI À ESPERA DE QUE VOCÊS NOS LEIAM E, SE POSSÍVEL, DEIXEM UM COMENTÁRIO.

ABRAÇO FRATERNO.

(HOMERO DE LINHARES)


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AVISO AOS INTERNAUTAS,

A PARTIR DE HOJE, ESTOU AQUI COM HOMERO DE LINHARES, REVEZANDO NA ARTE DA PALAVRA.

GRANDE ABRAÇO.


(DAVID BELLMOND)







quinta-feira, 17 de dezembro de 2009

MENIFESTO DO PROFESSOR ( Autor Desconhecido)





Encontrei este panfleto sobre a mesa dos professores numa escola de Vitória. Resolvi fazer algumas inserções sem prejuízo do original e reproduzir aqui afim de disseminar dentre os colegas do ofício. Dê a sua contribuição: compartilhe com outros companheiros esse manifesto.






VEJA PORQUE O PROFESSOR ADOECE, O ALUNO NÃO APRENDE E A VIOLÊNCIA ASSUME PROPORÇÕES INCONTROLÁVEIS


O prefeito quer voto e riqueza, por isso usa a escola como palanque. Nomeia um oportunista, o secretário de educação, que quer fama e gratificação gorda e, quem sabe, uma carreira política. Os dois usam o líder comunitário de caráter duvidoso e ignorância bem conhecida. Este, controlado pela central das associações de moradores, órgão responsável pelo curral eleitoral, está nas mãos dos prefeitos.


Os empresários financiam as campanhas dos políticos (prefeito), portanto mandam no legislativo que, por sua vez, controlam o povo juntamente com as emissoras de televisão e agências de propaganda que vendem os produtos dos empresários para toda a sociedade.


Nasce do ambiente social e escolar o diretor das unidades de ensino: cansado, de vida familiar mal-resolvida, falido financeiramente, fracassado enquanto regente, pouco ensinou, pois ninguém quis aprender, no máximo um bom gritador, já de certo tempo de serviço. Emburreceu profissionalmente ao longo de sua vida funcional, nunca teve formação decente e se acha no direito de julgar a capacidade dos professores comandados por ele. Aqueles que poderiam fornecer ao diretor tal aprimoramento, os técnicos da secretária de educação, só lhe forneceram conformação. Muitos técnicos são também fugitivos, indicados por políticos, mal formados e desinformados, ou até mesmo de mau caráter. Estão ali (na secretaria de educação) para fugirem de sala de aula, com toda razão.


Os diretores fazem questão de não andarem na lei. E começam seu reinado pelas portarias: a cada portaria uma reunião. O professor com crise renal precisa tomar água constantemente. Reunião com a equipe pedagógica. A professora da educação infantil, com cistite, vai duas vezes ao banheiro. Nova reunião. O professor de Português expulsa alunos da sala de aula devido à indisciplina. Reunião com os coordenadores. O prefeito resolve esburacar toda a cidade para pagar dívida de campanha com empreiteiras, causando transtornos e engarrafamento e atrasos. Reunião. Anota cinco minutos de atraso do professor de inglês. Incute na cabeça fraca do professor que ele tem que dominar o aluno, subjugar, intimidar, fazer cara feia, gritar, estourar a sua garganta. Nunca admite, ou a sua ignorância não o permite ver, que a educação tem que ser um valor social. Da mesma forma que o futebol é. Se fosse um valor, automaticamente o aluno buscaria, portanto, usaríamos o método pedagógico para aprimorar, não para curar como o pedagogo induz: cola, pinta, tira foto, faz projeto pedagógico, mas não dá aula. Surge o professor multimídia, que faz tudo...menos dar aula.


Esta prática de direção traz como consequência as mais variadas doenças ocupacionais. Quem adoece o professor? Quem torna a profissão um fardo? . Quem permite que o aluno xingue e agrida o professor? Quem implanta a política assistencialista do governo nas escolas? Resposta: o diretor fugitivo. Quem permite que o aluno detonado e desinteressado fale que a sua aula não é interessante? Bom, aí não é só o diretor.


Surge em questão uma nova figura, o pedagogo; seu histórico escolar da graduação é de dar inveja a Gandhi, Martin Luther king e Che Guevara ao mesmo tempo. Estudou Filosofia, Sociologia, legislação, Políticas públicas, História da Educação e muito mais: Marx, Durkheim, Chalitas, Içami Tiba, Paulo Freire, Paulo Coelho, Roger Rabbit e etc. E mesmo assim se localiza bem à direita da direção. Às vezes dá a impressão de que é um vice diretor. Em via de regras: nunca fala das leis que podem ser usadas para beneficiar a educação de qualidade, não deseja sequer que o aluno tenha melhores condições sociais, não sugere luta social alguma. Luta sindical nem pensar. Você já viu pedagogo encaminhar greve em escola? Liderar algum movimento político contra a secretaria de educação? Denunciar diretor por abuso de poder ou omissão? Reclamar de diretor que, em vez de fazer a gestão apregoada pela nova educação, fica pelos cantos vigiando professor? O que há de errado com esta função? Você se lembra de cobrança de pautas? Parece que o trabalho do pedagogo na escola se resume a isso. Se você é pedagogo atuante, favor desconsiderar. È que isso não é comum.


Professor, abra o olho, Professor. Você não é um fraco. Muito pelo contrário. O que acontece é que as leis não são cumpridas. Não são porque ninguém pede ou exige. O jurídico do Sindiupes não quer ter trabalho e manipula os fracos dos sindicalistas. Grita-se muito e legalmente não se encaminha nada. Por exemplo: Em caso de agressão ao professor, por que o jurídico não comparece à escola agressora? Por que o sindicato não faz relatório e encaminha legalmente o caso ao Ministério Público Federal contra o diretor e a secretaria de educação? Isso não acontece porque é mais fácil adoecer o professor.


Os diretores das unidades de ensino se omitem e não encaminham juridicamente os alunos que não têm bom rendimento, indisciplinados, drogados, sem tutor de foto, desacompanhados da vida escolar e social. O aluno ilegal não é encaminhado para que o diretor não tenha trabalho e nem dê trabalho ao prefeito e conseqüentemente às outras secretarias: ação social, secretaria de obras, de transporte, direitos humanos e secretaria de saúde. A secretaria de saúde não vê a hora da prefeitura ser acionada e eles pedirem também condições de trabalho, pois na saúde ninguém quer fazer o papel de psicólogo sem ser, de psiquiatra sem ser, o de mãe sem ser, o de pediatra sem ser. Ali tem profissional, ninguém da saúde quer se responsabilizar pelo modelo social brasileiro. Com razão.


Este modelo vivido e sentido pelo professor não é percebido pelo educador. Nas escolas convidam artistas de renome local ou nacional para iludir a comunidade escolar, querem chamar até exorcista, menos a lei, menos o Ministério Público Federal, pois o Estadual provavelmente pertença ao governador. O docente não percebe que o aluno é educado para não se interessar pela escola e que existe uma receita de bolo para tirar o aluno da escola e conseqüentemente odiar o professor. Essa receita começa em um lugar aparentemente inocente e virtuoso, o CEMEI: lá o estatuto do menor e as outras leis que amparam a criança que poderiam ser usadas em beneficio delas, são covardemente ignoradas pelos diretores dessas unidades, começando aí a construção do aluno bomba que explodirá com gritos, preguiça, descaso, rojões, extintores de incêndio depredados e os hormônios na cara do professor de quinta a oitava. O diretor do CEMEI permite que a criança seja detonada pela família e pela sociedade em geral. A família consente que a criança seja direcionada para a televisão, jogos eletrônicos, propagandas, novelas pornográficas e muito mais. O resultado do descaso é um aluno que não consegue calar, nem ler e quando lê não entende. O aluno com excesso de mídia não consegue ler, fotografa as palavras. Que covardia! Será que pulei uma etapa? Depois do aluno detonado pelo CEMEI, começa a domação de primeira a quarta até a explosão. Bum! Está formado o bonde dos homens bombas (BHB), os bandidos que lotarão os presídios e as covas rasas.


Nas formações, digo: conformações, não são discutidas as leis, não são discutidas as omissões, o abandono de incapaz, do modelo social. Não se discute a rotina do aluno que fica o dia inteiro na TV, no play station, na rua. A família nunca lhe deu a opção ou lhe recomendou livros, historinhas, teatro e boa música. As conformações servem para subjugar o professor e garantir a amputação intelectual do estudante, gerando retardamento, pois esse é o objetivo principal da secretaria de educação, quanto mais retardado melhor. E não cometa a loucura de afirmar que seu aluno falastrão, indisciplinado e incapaz de aprender o mínimo seja um retardado, uma vez que essa atitude pode lhe trazer sérios problemas para o resto da vida. As secretarias de educação ignoram a existência do professor, mas se o aluno ligar para um daqueles técnicos devedores de favores ao prefeito, ao governador, aos parlamentares, aos diretores, e que passam o dia matando moscas em suas salas, eles comparecem à escola imediatamente a fim de que sejam apuradas as irregularidades nas pautas do professor de matemática que deixou metade da turma de recuperação e impor aprovação em massa independente do nível de interesse de alunos e de qual seja a denúncia feita. Com isso, o aluno normal e interessado não tem nenhum projeto ou atenção. Está fadado ao fracasso já que a escola se ocupa de apagar o incêndio provocado pelos alunos problemas.


Portanto, professor, o foco principal da nossa luta não é o salário. Exija condições de trabalho, pois o salário será consequência da educação como valor. A sociedade é feliz às suas custas. A escola tem distribuído imunidade para não se cuidar dos filhos de todo mundo. Pare de aceitar as desculpas. Faça greve junto com a categoria no ano que vem e comece o ano letivo com operação padrão. Seja professor, só aceite o aluno legal. Dê aula para aqueles 6 alunos interessados e o restante ficará com o diretor na quadra (talvez assim ele pare de ficar pelos cantos lhe vigiando como aqueles monstros criados pela ditadura afim de reprimir qualquer manifestação de insatisfação) até que ele use a lei (com outro objetivo que não seja o de ferrar professores) ou os transformem em estudantes.








PS: A gratificação de diretor é R$ 2000,00 + R$ 2000,00 em uma cadeira + R$ 2000.00 em outra cadeira. Total R$ 6000,00. Diretor do Estado: R$ 6200,00 de gratificação para a tipologia de 1500 alunos + salário de R$ 4000,00 em duas cadeiras, o que dá um total R$ 10200. Se ele precisasse realmente trabalhar para fazer jus ao salário, não estaria nadado contra a correnteza do interesse real do magistério.

(Autoria desconhecida/17 de dezembro de 2009)

terça-feira, 8 de dezembro de 2009

O PT MORREU E ESQUECEMOS DE ENTERRÁ-LO!



PT...SAUDAÇÕES

Sabe aquele PT ao qual eu e você éramos filiados?  Aquele PT que acompanhava nossas passeatas contra a opressão do patrão? Aquele PT que lutou cotra a censura e contra a ditadura?  Aquele PT que pregava a justiça e a igualdade?  Pois é, aquele PT morreu e já fede junto com os vermes que o devoraram.  Não sobrou sequer a lembrança do significado da sigla (Partido de quê?): Partido dos Traíras, Partido dos Tiranos.

A Prefeitura Municipal de Vitória, capital comandada pelo PT, enviou um decreto aos seus servidores declarando que a partir do presente (dezembro de 2009) fica terminantemente proibida qualquer manifestação, assembléia ou reclamação por parte daqueles que se consideram injustiçados.  O decreto ressalta ainda que o magistério, mais que as demais categorias, deixa de ter direito a se ausentarem do trabalho para se reunirem em assembléias comandadas pelo seu sindicato.  Maquiavel enfim se assumiu nas máscaras dos secretários nomeados pelos nossos líderes Petistas.  Que o PSDB, o PMDB, o DEM e outras siglas ignorassem o direito do trabalhador de se expressar já não era novidade...Mas o PT, partido formado nas bases sindicais, nos movimentos sociais, agir agora como Stalin, Mussolini, Hitler, é de apavorar mesmo os mais esperançosos na estrela vermelha.  Agora é esperar o caos. 

Pois bem, companheiros,  a luta chegou ao fim, a dignidade do trabalhador foi de vez maculada.  O PT morreu e esquecemos de enterrá-lo junto com nossos sonhos de igualdade.

Nossos direito adquiridos?
PT...Saudações!

(Homero de Linhares / 07 de dezembro de 2009)

segunda-feira, 7 de dezembro de 2009

YES, NÓS TEMOS STRIPPERS



SOCIEDADE DOS póETAS MORTOS

Foi o Robin Williams quem disse, num comentário infeliz, que o Brasil só ganhou a disputa para sediar as Olimpíadas em 2016 por ter mandado 50 strippers e meio quilo de pó para o Comitê Olímpico.  Como diz aquele ditado: Quem tem telhado de vidro...Pois é o ator já enfrentou problemas pelo uso de drogas, entre elas cocaína. Ele chegou a ser internado em uma clínica de desintoxicação por causa do vício.  Creio que ele tenha sido um dos beneficiados pela cocaína distribuída no evento.  Grande decepção dos fãs brasileiros, que ignoravam ser o ator norte-americano uma pessoa incoerente, inconveniete e digna de uma grosseria dessas.  A xenofobia e a supremacia tola falaram alto na voz do intérprete daquele professor do filme "Sociedade dos PÓetas mortos" e de "PÓpeye". Triste decadência, Senhor Robin Williams.  Se fosse mesmo verdade, em que diferiríamos daquele povo decadente e que não sabe perder?

(Homero de Linhares / 06 de dezembro de 2009)

quinta-feira, 26 de novembro de 2009

CARPE DIEM


CARPE DIEM / SEIZE THE DAY


A vida é agora
por isso eu vivo
a cada momento
como se fosse embora
pra não mais voltar.
.....................
Life is now
Because of it I alive
In every moment
As if I'd go away
To never be back.
...................
A vida é curta
por isso eu vivo
mil dias em um
na absoluta
luta por prazer.
.................
Life is short
Because of it I Alive
One thousand days in only one day
In complete
Fight by pleasure.
...................
A vida é efêmera
por isso eternizo
meu olhar o mundo
na pedra, no tempo
com versos e risos.
...................
Life fades away
Because of it I'd be forever
In my sight of the world
In the rock, in the time
With verses and smiles.


(David Bellmond / Tradução de Elionai C. Cordeiro / 25.11.09)

segunda-feira, 2 de novembro de 2009

PAUSA PARA A CHUVA QUE NÃO DÁ TRÉGUA (1)





A CHUVA

"A chuva derrubou as pontes. A chuva transbordou os rios. A chuva molhou os transeuntes. A chuva encharcou as praças. A chuva enferrujou as máquinas. A chuva enfureceu as marés. A chuva e seu cheiro de terra. A chuva com sua cabeleira. A chuva esburacou as pedras. A chuva alagou a favela. A chuva de canivetes. A chuva enxugou a sede. A chuva anoiteceu de tarde. A chuva e seu brilho prateado. A chuva de retas paralelas sobre a terra curva. A chuva destroçou os guarda-chuvas. A chuva durou muitos dias. A chuva apagou o incêndio. A chuva caiu. A chuva derramou-se. A chuva murmurou meu nome. A chuva ligou o pára-brisa. A chuva acendeu os faróis. A chuva tocou a sirene. A chuva com a sua crina. A chuva encheu a piscina. A chuva com as gotas grossas. A chuva de pingos pretos. A chuva açoitando as plantas. A chuva senhora da lama. A chuva sem pena. A chuva apenas. A chuva empenou os móveis. A chuva amarelou os livros. A chuva corroeu as cercas. A chuva e seu baque seco. A chuva e seu ruído de


vidro. A chuva inchou o brejo. A chuva pingou pelo teto. A chuva multiplicando insetos. A chuva sobre os varais. A chuva derrubando raios. A chuva acabou a luz. A chuva molhou os cigarros. A chuva mijou no telhado. A chuva regou o gramado. A chuva arrepiou os poros. A chuva fez muitas poças. A chuva secou ao sol."

(Arnaldo Antunes, 1992)

PAUSA PARA A CHUVA QUE NÃO DÁ TRÉGUA (2)

OUTRA VEZ A CHUVA





A chuva impiedosa
Aumentou as minhas mágoas
E amarelou as águas
Da baía de Vitória.

Quem disse que a chuva é imparcial?
Quem é que fica alagado?
Quem fica desabrigado?
O rico ou o marginal?


A chuva vem com certeza
Balançando meu telhado
Vem com vento e trovoada
Aumentar minha pobreza.


Meus livros todos torcidos,
Os meus discos estragados,
Minha varanda alagada
E eu em casa encarcerado.


A chuva vem outra vez
Destruir em poucas horas
(a chuva ri, minha alma chora)
O que eu ganhei em um mês.



(Homero de Linhares / 02 de novembro de 2009)


segunda-feira, 12 de outubro de 2009

LIVRO "VIDA VIDE VERSO" (PÁGINAS 40 E 41)


A FILA

A fila se estica,
Enviesa, se espreme.
Tem forma de esse,
De dáblio, de ene.
Tem corpo colorido:
Vermelho de cólera,
Amarelo de cansaço,
Cinza de demora
Ou branco seria?

A fila tem mãos
Que escrevem poesia,
Que acenam, se coçam,
Que se cruzam, endossam.
A fila tem braços
Sem mãos, sem noção
Da nobre missão
Do dedo polegar,
Autógrafo de analfabeto.

A fila se estica,
Os enfileirados se amassam,
Discutem política
E as horas passam.
Quem anda entediado
Com a rotina tranqüila
Acha tudo engraçado
E quer entrar na fila.

Lá na frente um maroto
Tenta se adiantar,
Mas a fila protesta
E promete se rebelar.
Soam coros indecentes
Ao vagaroso atendente.
A fila tem aroma
De suor, de colônia,
De naftalina.
Finda o expediente
E a fila não termina.

(BELLMOND, David. VIDA VIDE VERSO. Editora do autor: Vitória-ES, 1999, Páginas 40 e 41.)

LIVRO "VIDA VIDE VERSO" (PÁGINA 42)


QUARTO DE TREVAS

Um olhar enevoado
No rosto sério e calado
De um anjo torto e sem asas
Ilumina a escuridão
Do quarto e da imensidão
De um poeta estarrecido.

E o poeta vela a sombra
Envolta no rosto dela
Sem saber quais os sintomas
Que o obrigam a olhar pra ela.

O quarto preso no abismo
Mas lá fora o crepúsculo é pior.
Tem sol, mas não tem o resquício
De luz que há no olhar dela.

A face não envelhece,
Há uma infância ainda em seu rosto
Mas tantos anos já passaram
Na insônia nupcial.
No entanto o poeta se veste
E penetra mais nas trevas
Da rua que não é de trevas.

(BELLMOND, David. VIDA VIDE VERSO. Editora do autor: Vitória-ES, 1999, Página 42.)

LIVRO "VIDA VIDE VERSO" (PÁGINA 43)


DEGREDADA

Degredada
Filha de Eva
Gemendo e chorando
No meio das trevas.

Humilhada
Filha de Maria
Amamentando os filhos
De barriga vazia.

Abandonada
Filha de Penélope
Tecendo solidão
Para sua própria veste.

Injustiçada
Filha de Joana
Defendendo os santos
Morrendo profana.

Encarcerada
Filha de Anastácia
Sofrendo horrores
Atrás da amordaça.

Esperançada
Filha de Teresa
Armando-se contra o mundo
Com o poder de sua reza.
Bem-aventuradas
Filhas de Maria
Alfabetizando os filhos
De barriga vazia.

(BELLMOND, David. VIDA VIDE VERSO. Editora do autor: Vitória-ES, 1999, Página 43.)

LIVRO "VIDA VIDE VERSO" (PÁGINA 44)


O POETA SOBREVOA A CIDADE

Segundo o censo do IBGE
Realizado em 1996,
Linhares possui 125.297 habitantes
E 1 poeta que há 30 anos chora de saudades
Longe dos arredores da cidade.
63.013 homens e 62.284 mulheres
Habitam Linhares
E 1 poeta longe com seu banjo,
Porque o poeta é como anjo
Que não tem seu sexo determinado,
Mas tem asas enormes e esquisitas.
E o poeta sobrevoa Linhares,
Anunciando o bem e o mal
Sobre a cidade natal,
Sem quedar-se em discurso maniqueísta.

(BELLMOND, David. VIDA VIDE VERSO. Editora do autor: Vitória-ES, 1999, Página 44.)

LIVRO "VIDA VIDE VERSO" (PÁGINA 45)


SONHO FRAGMENTADO

E eu que no sonho anterior
Sonhava voar sobre as casas,
Que tolice a minha agora acreditar
Ter asas,
Subir sobre os edifícios
E me atirar no abismo,
Me espatifar no chão.

Fragmentos de sonhos
Espalhados no chão,
Mas não são utopias,
São vísceras, coração
Que sucumbiu à banalidade
Da lei da gravidade.

(BELLMOND, David. VIDA VIDE VERSO. Editora do autor: Vitória-ES, 1999, Página 45.)

LIVRO "VIDA VIDE VERSO" (PÁGINA 46)


POEMA MENOR SOBRE A IMBECILIDADE

Era um homem
E era um rio.
A ponte sob o homem que passava sobre o rio,
Ou seria o rio sob o homem que passava sobre a ponte?
Um homem sobre a ponte olhando o rio
Propenso à loucura e ao vazio.

O vazio do homem
Por cima da ponte
Buscando o prazer e a fonte
Da felicidade perdida no horizonte
E de tanto pensar
Se joga no rio.

Não convém aqui reproduzir
A onomatopéia do corpo do homem
Chocando-se com as águas.

(BELLMOND, David. VIDA VIDE VERSO. Editora do autor: Vitória-ES, 1999, Página 46.)

LIVRO "VIDA VIDE VERSO" (PÁGINA 47)


MARIA BOA-VIDA

Maria Boa-vida de bunda arrebitada
Quer viver sua vida sem conquistar nada.
Conquistar, que isso seja sem luta travada,
Maria Boa-vida não quer lutar por nada.

Maria Boa-vida de cara maquiada
Quer se ascender na vida sem mão calejada.
As mãos têm outro fim pra Maria Boa-vida
Que não seja plantar sua própria comida.

Pra Maria Boa-vida, colher é o importante,
Ela colhe um pouco a cada novo amante.
Maria Boa-vida, soldadeira, ninfeta,
Tudo que faz na vida é tocar clarineta.

Tocar, que isso não tenha que cansar sua beleza,
Pois Maria Boa-vida só toca por defesa.
Defender-se da sina de tocar das mulheres
Que não são boas-vidas e não têm o que querem.

Maria Boa-vida só tem na sua agenda
Horário pra ancião dono de boa renda.
Maria Boa-vida, de flacidez precoce,
Tanto cedeu na vida que morreu sem ter posse.

(BELLMOND, David. VIDA VIDE VERSO. Editora do autor: Vitória-ES, 1999, Página 47.)

LIVRO "VIDA VIDE VERSO" (PÁGINA 48)




A ROSA

Dentro do teu olho raso
Na tua reza parnasa,
De riso desconcertado,
Há uma Rosa obesa.

Na rua em que cadencias
Teus rotos passos de homem,
A Rosa marcha no ritmo
Que rege a tua poesia

Na tua servidão rara
De regar a solitude
Com teus ritos de Romeu,
Uma Rosa te ampara.

No rumor da devoção
Do teu amor neo-romântico,
Uma Rosa ainda floresce
Nas rimas da tua canção.

(BELLMOND, David. VIDA VIDE VERSO. Editora do autor: Vitória-ES, 1999, Página 48.)

LIVRO "VIDA VIDE VERSO" (PÁGINA 49)




ESPELHO PAR

Quando te contemplo, Orides,
Graficumana condição,
Perdôo, aceito minhas matizes,
Deslizes.
Me estranho, poeta
Não sou não.

Sua mesquinhez, sua graça
Viva, palavra
Reflexo do último sol.
Minha mesquinhez, minha fala
Opaca, sem fruto,
Sem flor, sem formosura,
Sem clarão.

Que flor brotar no peito
De quem canta,
Se o canto é ainda mais
Dor que a solitude?
Ilude-se a formiga
De que sua faina telúrica
É ainda mais cansativa e dolorosa
Que o canto da cigarra.
No primeiro canto o último labor.

Quem canta abre os pulmões,
Desentope o peito,
Escarnece e faz rarefeito
O ar de quem ama.
Quem tem espelho sabe do diabo
E conhece a imagem do seu criador,
Pois dentro do ser esconde-se o que é heterogêneo.

(BELLMOND, David. VIDA VIDE VERSO. Editora do autor: Vitória-ES, 1999, Página 49.)

LIVRO "VIDA VIDE VERSO" (PÁGINA 50)


MIA SENHOR SEM NOME

Em quantos versos queres que eu te faça musa,
Sem pintar suas madeixas negras onduladas,
Escondendo a veneração exagerada
Que teu coração quer e teu corpo recusa?

Quanto tempo queres que eu espere calado,
Amada, amante, musa, ou nada disso...amiga?
Quantas noites queres ainda que eu siga
Negando a toda gente estar apaixonado?

Barganho, mia Senhor, por um único beijo
Meus versos ainda que me esqueças após
Distanciarem os meus lábios dos seus e o nós
Que me guiam a tais olhares e desejos.

Um beijo só e seu e eu me limitaria
A beijar teu vulto sem sequer te falar,
E até a morte minha iria eu te beijar
Apenas no universo da minha poesia.

Eu te condenaria ao mencionar teu nome,
Amor secreto, amor por mim desmerecido.
Ah! Eu seria um louco, um fraco, um bandido
Se eu revelasse ao mundo que se chamas...Fome

Fome ou sede (não sei qual é o mais correto)
De arrancar de mim esta vontade louca
De desvendar teu sonho. O que me dar em troca
Desta minha paixão, deste meu peito aberto?

Amemos em segredo ou deixe que eu te ame
Sem que ninguém perceba meu frágil amor,
Que assim nunca terás razão em mim pra dor
E jamais me dirás não, mia Senhor sem nome.

(BELLMOND, David. VIDA VIDE VERSO. Editora do autor: Vitória-ES, 1999, Página 50.)

LIVRO "VIDA VIDE VERSO" (PÁGINA 51)


O HOMEM ELEVADO AO OCASO

Pensam que debruço-me à janela
Assistindo a vida alheia.
Debruço-me sobre o horizonte
Na espera de traduzir seus signos.
Os homens, pseudo-vidas,
Põem-se entre mim e o acaso.

(BELLMOND, David. VIDA VIDE VERSO. Editora do autor: Vitória-ES, 1999, Página 51.)

LIVRO "VIDA VIDE VERSO" (PÁGINA 52)


PROSOPOPÉIA

Toca aqui na minha mão,
Vê quantos navios têm
Para atravessar o sertão,
Vê quantos guerreiros santos
Me levam a Jerusalém.

Olha bem na minha retina,
Vê quantos raios de sol
Beijam paisagens cristalinas,
Vê quantas rimas perfeitas
Enfeitam meu arrebol.

Contempla bem meu sorriso,
E quantos profundos lagos
Miram-me e eu Narciso
Afogo os remotos mares
Em troca de um mero afago.

(BELLMOND, David. VIDA VIDE VERSO. Editora do autor: Vitória-ES, 1999, Página 52.)

quinta-feira, 8 de outubro de 2009

LIVRO "VIDA VIDE VERSO" (PÁGINA 53)


CANTIGA PARA OS FUNCIONÁRIOS PÚBLICOS
DA PREFEITURA MUNICIPAL DE CU DO MUNDO

Era jovem a Genoveva
Quando o jactancioso
Poetinha Rubem Braga
Não era nome de lei.

Hoje a Genoveva vive
Sem ver que a vida alheia
É a veia da existência
Dos altos prédios erguidos
Nas mínimas avenidas
Da capital dos seus sonhos.

Vive a velha Genoveva
Entre atritos de gengivas
E dentes alternativos,
Contagem de níqueis provindos
Dos cidadãos inativos
Da cidade litorânea.

Ignora a Genoveva viúva
Que o sustento da sua velhice
Vem da gente analfabeta
Que transita despercebida
As ruas do município
Lá onde o vento faz a curva,
Projetado no cu do mundo.


(BELLMOND, David. VIDA VIDE VERSO. Editora do autor: Vitória-ES, 1999, Página 53.)

LIVRO "VIDA VIDE VERSO" (PÁGINAS 54 E 55)




HIEROGLIFOS ORAIS

Lugar comum,
Futuro nenhum.
Não mais me seduz
A palavra chavão
Corroída pelo uso,
Abuso e repetição
E dissonância.

O termo perfeito
Já ganhou trejeito
De expressão vulgar.
O cosseno a se equacionar
Entre as metáforas,
As divisões silábicas
Com novos teoremas.
O emprego do trema
No vetor do poema.

Latina maldição
Do verbo rotulado,
Mensagem sem expressão
Dos argumentos patéticos
Na luz dos neolíticos.
Bom dia! Como vai?
Qual seu partido político?
Qual seu filme predileto?
Que idade você tem?
Beabá, abecê, etcétera,
Blablablá, nhenhenhém.




O velho Aurélio, artefato
De alguma civilização perdida,
Nada ouve, nada vê, tudo olvida,
Nada traduz do país analfabeto,
Nem há recordações
De qualquer período aquém
Dos diálogos dissilábicos
E arte em out-door.

(BELLMOND, David. VIDA VIDE VERSO. Editora do autor: Vitória-ES, 1999, Páginas 54 e 55.)

LIVRO "VIDA VIDE VERSO" (PÁGINA 56)




FOLHETIM AVULSO

O bondoso mocinho,
Bonitinho, bonzinho,
Sofre nas mãos do vilão
Durão, bonachão.

A bela donzela,
Síndrome de Cinderela,
Não cede à sedução
Do poderoso vilão.

Um dia o mocinho
Pobrezinho, bonzinho,
Descobre que é herdeiro
De uma fortuna em dinheiro.

A bela donzela,
Tão bela, tão bela,
Casa-se com o mocinho
Riquinho. bonzinho,

No fim da novela
O vilão se regenera
E recebe, então,
Do mocinho o perdão.

(BELLMOND, David. VIDA VIDE VERSO. Editora do autor: Vitória-ES, 1999, Página 56.)

LIVRO "VIDA VIDE VERSO" (PÁGINA 57)


EFE...

Foi-se
E fez de outro infeliz
Sua fuga perfeita
Para futilidade,
Foice
Decepando minha fé
Num futuro perfeito,
Dito e feito,
Não sei mais sonhar direito,
Fiquei fraco,
Faminto,
Fatigado da luta,
F...
Não fui feito para dor,
Minha fé decepada
Me forçou outra vez
Voltar a ser feliz.

(BELLMOND, David. VIDA VIDE VERSO. Editora do autor: Vitória-ES, 1999, Página 57.)

LIVRO "VIDA VIDE VERSO" (PÁGINA 58)


EVOLUTIVO

Dor vai
Dor vem
Darwin
Não me conven-
Ce de que o ín-
Dio sul-ame-
Ricano provém
Do macaco eu-
Ropeu narciso.
Símio esquizo-
Frênico ateu,
Dono do mar
E homem no pa-
Raíso.

(BELLMOND, David. VIDA VIDE VERSO. Editora do autor: Vitória-ES, 1999, Página 58.)

LIVRO "VIDA VIDE VERSO" (PÁGINAS 59 e 60)


CANTO A DESDÊMONA

Nada tenho de meu
Das viagens que fiz,
Nada trouxe dos mares
Que outrora velejei.
Tenho apenas o andor
E o corpo ferido
Pelo gume de espadas
De hordas que enfrentei.

Nada tenho que possa
Dar-te em troca do amor
Se tudo que possuo
É tudo que vivi
Lutando com Netuno,
Encantando sereias,
Fazendo meu escudo
Da minha cara feia.

Feia sim, por que não?
Se não sou erudito
Tal qual Hamlet travesso
Ou sábio como Platão.
Se quiser sobre mim
Posso tudo contar,
Esperando que assim
Você aprenda a me amar.

Posso te amar até
Que me corroa o ciúme
E eu te arranque a vida
Com a ira, com o gume
Da mesma espada fria
Usada nos combates,
Destronando reis maus
E apaixonados vates.

O demônio sou eu,
Não é quem me envenena.
Eu sou digno de morte,
Iago digno de pena.
O descobrir da verdade
Já tarde me condena.
Antes eu nunca soubesse
Que me amavas, Desdêmona.

(BELLMOND, David. VIDA VIDE VERSO. Editora do autor: Vitória-ES, 1999, Páginas 59 e 60.)

LIVRO "VIDA VIDE VERSO" (PÁGINAS 61 e 62)




EGOFOBIA
À minha professora da oitava série, Marisa Badauê

O medo da solidão
Ë maior que o da morte.
Morrerei uma só vez,
Sozinho estarei sempre
Deixando que o meu ego
Relute com imagens
Dialogando com miragens
Que às vezes lhe convém.

Temo adormecer
Assim abandonado
Para que eu não acorde
Conversando comigo.
Preciso de um amigo
Diferente do lobo
Que mora dentro de mim,
O qual não é um lobo mal
Mas é um lobo tal
Que me prende à incógnita
Da vida incognitável.

O medo da solidão
Mata antes de morrer.
É feito guilhotina,
É feito heroína
Que me invade as veias
E antecipa o fim,
Concedendo vida longa
Ao lobo dentro de mim.

Porém matarei o lobo
Que me subverte o coração,
Apunhalando o peito
Esquerdo e o esquartejando.
Assassinarei assim
A minha egofobia,
Ainda que em agonia
Tombe todo o meu ser
E eu morra abandonado
Nas mais só das solidões.

(BELLMOND, David. VIDA VIDE VERSO. Editora do autor: Vitória-ES, 1999, Páginas 61 e 62.)

LIVRO "VIDA VIDE VERSO" (PÁGINA 63)


PEDRA DURA

Órgão mole
Em carne dura
Tanto bate
Até que gera
Toda a prole
Contra a cultura
Tanto fala
Pouco supura
O tumor da dita mole
Dita destra
Citada dura.

Água podre
E pão de usura
Cala a boca
E não tortura.
Alma mole
Pedra dura
Tanto encarna
A escultura
Quando escarna
Da mesura.
Alma mole
Em sepultura,
Ainda resiste
A alma dura

(BELLMOND, David. VIDA VIDE VERSO. Editora do autor: Vitória-ES, 1999, Página 63.)

LIVRO "VIDA VIDE VERSO" (PÁGINA 64)


CAPIXABANDO

Capixabas analfabetos
Capixabas sem teto
Capixabas analfabetos
Capixabas sem projetos
Capixabas analfabetos
Capixabas sem dialeto
Capixabas analfabetos
Capixabas obsoletos
Capixabas analfabetos
Capixabas nos guetos
Capixabas analfabetos
Capixabas sem afeto
Capixabas analfabetos.

Capixabas tristonhos
Capixabas risonhos
Capixabas medonhos
Capixabas, suponho,
São bichos enfadonhos
Disfarçando de sonho
O que lhes é ditado.
Capixabas amordaçados.

Migalhas do dia a dia
Navalha na hipocrisia
Mortalha todo dia
Politicalha e sangria
Batalha em demasia
Escangalha a utopia
Mas quase nunca porém
Entretanto, todavia,
Trabalha e confia.

(BELLMOND, David. VIDA VIDE VERSO. Editora do autor: Vitória-ES, 1999, Página 64.)

LIVRO "VIDA VIDE VERSO" (PÁGINAS 65 E 66)


BONS TEMPOS

Bons tempos em que a ladeira
Não tinha calçada e a gente
Tirava o barro das ruas
Para fazer casa de estuque.
O telhado eram folhas
De bananeira ou coqueiro.
Quando chovia lá dentro
Saíamos para o aguaceiro.
Voltávamos encharcados
Com gripe e nosso pai zangado
Nos punia com chicotes
Feitos de varas de goiaba.

Bons tempos em que o pão
Era repartido ao meio,
Manteiga escassa, leite não.
Ensopado de carne bovina
Era só no início do mês
E suco das laranjas
Que a gente pegava na feira.
No jantar um ovo frito
Novamente repartido
Com feijão e um pouco de arroz.

Bons tempos em que a lata d’água
Era diariamente transportada
Morro abaixo, morro acima.
Minha mãe lavando roupa
Para por os filhos na escola.
Os filhos no colegial,
Minha mãe sem saber ler.

Bons tempos que na verdade
Só despertam a saudade
Do meu pai contando histórias
Sobre os imensos cafezais
Do velho Odilon Milagres
E suas façanhas juvenis
Nos bailes lá do sertão,
O acordeão e as namoradas
Espalhadas nas cidades.

------------------

Hoje a vida é menos pungente.
Pouco mudou, mas estamos
Prestes a crer no futuro.
E se mudou alguma coisa,
Mudou a família unida
Na hora de adormecer,
Onde minha mãe obrigava
Todo mundo ao padre nosso,
Rezando a Ave Maria
Por tantas barrigas vazias.


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Bons tempos que de lembrar
Pontadas sinto no peito
E me esqueço quando sinto
Vontade de ser feliz.

(BELLMOND, David. VIDA VIDE VERSO. Editora do autor: Vitória-ES, 1999, Páginas 65 e 66.)

LIVRO "VIDA VIDE VERSO" (PÁGINA 67)


VOCÊ SABE COM QUEM...?

A mulher do coronel pensa que
É coronel e o filho do coronel
Pensa que é coronel e a copeira
Do coronel pensa que é coronel
E o jardineiro do coronel pensa
Que é coronel e o chofer do coronel
Pensa que é coronel e o amigo
Do coronel pensa que é coronel
E o acessor do coronel pensa que é
Coronel e o segurança do coronel
Pensa que é coronel é o soldado que
Presta continência ao coronel
Pensa que é coronel e o coronel
Pensa que é general.

(BELLMOND, David. VIDA VIDE VERSO. Editora do autor: Vitória-ES, 1999, Página 67.)

LIVRO "VIDA VIDE VERSO" (PÁGINA 68)




TRIÂNGULO AMOROSO

Ou uma, ou outra.
Seno ou cosseno afetivo,
Hipotenusa indecisa.

Uma e outra.
Tangente emaranhado de órgãos.
Adjacente sobre o oposto,
Ambos sobre a hipotenusa.

Nem uma, nem outra.
Catetos originando retângulos,
Circunferências, pentágonos.
Hipotenusa isolada.
O amor só tem dois lados.


(BELLMOND, David. VIDA VIDE VERSO. Editora do autor: Vitória-ES, 1999, Página 68.)

LIVRO "VIDA VIDE VERSO" (PÁGINAS 69 e 70)




BATALHA

Minha cabeça
Absoluta
Luta
Com a palavra,
lavra
Hipóteses,
Teses, tosas em
Escrupulosa
Lousa
De Houaiss,
Ais
Fomentando
(ando
Em linha reta)
arestas,
Pseudo-termo
Ermo
Universo,
Verso
Concreto dia
Leto
Abstrato,
Lesto
Contato,
Tato
Aceso da poesia.


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II
Para ser
Concreto
Basta fazer
Crer
Que não é
Abstrato
Nem Ter flor
No teto
Dos seus
Desacatos
Nem Ter
Sutileza
Na sua agres-
São
Basta ter
Visão
Para o nada
Ver
Ter poder
É ter
Isenção
Do ób-
Vio
Semear
O ócio
Por onde
Versejar
Praguejar
O longe
Sem nunca
Ir lá.



(BELLMOND, David. VIDA VIDE VERSO. Editora do autor: Vitória-ES, 1999, Páginas 69 e 70.)

LIVRO "VIDA VIDE VERSO" (PÁGINA 71)




O ANJO MORTO
À Conceição e Rodrigo

A mãe acalanta o filho
Num berço de desprazer,
Concentrando no menino
O orgulho de ser mulher.

Se o pequeno chora, a mãe
(no frio daquele leito)
Lhe cede o colo, o canto,
A voz amiga, o peito.

Enquanto esperam soturnos
A providência divina,
O pai por certo perambula
Em ignorada esquina.

A mulher amamenta o filho
Crendo que o choro é de fome,
Porém dentro do menino
Há uma dor que não tem nome.

A mãe entra em desespero
Com o choro da criança.
Falta fubá pro mingau,
Falta razão pra esperança.

Por fim o filho adormece,
Enquanto a mulher cantarola:
Quem sabe um dia ele cresce?
Quem sabe vai à escola?

A mãe embala o anjo
Crendo que ele está vivo,
Sem saber que ele dorme
O sono definitivo.

(BELLMOND, David. VIDA VIDE VERSO. Editora do autor: Vitória-ES, 1999, Página 71.)

LIVRO "VIDA VIDE VERSO" (PÁGINA 72)


UNIVERSO / VERSO

No centro de tudo no centro de tudo no centro de tudo
No centro de tudo no centro de tudo no centro de tudo
No centro de tudo no centro de tudo no centro de tudo
No centro de tudo ESTOU EU no centro de tudo
No centro de tudo no centro de tudo no centro de tudo
No centro de tudo no centro de tudo no centro de tudo
No centro de tudo no centro de tudo no centro de tudo

Trabalhar o verbo
Ver brotar o eterno
Mar ermo
Flor fosca
Dor tosca
Ver escrever ver escrever
Labutar o verso
Dolorido espesso
Desmedido denso
O poeta busca
O lado do espelho
Ainda não ocupado

(BELLMOND, David. VIDA VIDE VERSO. Editora do autor: Vitória-ES, 1999, Página 72.)

LIVRO "VIDA VIDE VERSO" (PÁGINAS 73 a 78)




DIÁLOGO COM O POEMA

Poesia, és o meu ópio.
Em ti me entorpeço,
Me mereço, me excedo,
Resmungando coisas de que tenho medo,
Inventando símbolos que nunca existiram,
Transpondo limites da minha condição.

Poesia, és minha perdição.
Em ti sou rendido,
Me agrido, me nego perdão,
Confessando bichos do fundo da alma,
Visitando infernos ao redor
Do meu paraíso que pincelo débil.

Poesia, és o meu ardil.
Em ti me guarneço,
Fora de ti sou fraco, feio, frio,
Sem esperanças, sem quintessências.
Desço ao túmulo da dura existência
Até que desperte o canto de Cecília.

Poesia, és o meu testamento.
Em ti me confesso,
Me ensoberbeço, me perpetuo
Nas construções patéticas, assintáticas, herméticas,
Onde reina meu verbo e bebo do meu sangue
Desperdiçado ao longo da minha oração.
__________________________


II

Meus poemas são intervalos
Entre uma dor e outra
No instante em que me deparo
Com tantas chagas abertas
E me comparo com os outros
Vermes fugindo do esgoto.

Me firo, paro, me inspiro
E em versos me readquiro
Senhor dos trovões e do vento.
Tudo que a alguns instantes
Era inferno absoluto
Não passa agora de lamento
Apreciado por minhas mãos
Correndo papel à fora.

A vida brotando da dor
Que pensava ser a vida
Mas não era vida, era dor
E fez-se vida ao revelar-se
Nas minhas freqüentes insônias.
Eis o mal remediado
Na eternidade da escrita.


___________________________________



III

Não era desta forma
Que eu queria te compor,
Poema que agora foge,
Talvez fosse mais sentido
E um pouco mais erudito.
Não tão assim sem nexo
Sem sexo sem eixo
Sem rima e remelexo.

Tento te escrever
Enquanto me disperso
E o guarda perambula rondando a rua
E máquinas trabalham na impressão do jornal
E máquinas trabalham na fabricação do pão
E eu, homem, não sou máquina,
Não consigo te compor
Pois luto com o sono
E a máquina de escrever
E imagens varam a noite me perseguindo.

Mas dorme em paz, meu poema,
Que amanhã eu te desperto.
Talvez até esqueça que queria te compor
E os mesmos vocábulos não me permitam mais
Te escrever novamente
E deixo para outro dia.
Assim vou te adiando até me esquecer
Que Deus me fez poeta
E estou entregue às traças.
______________________________

IV

Não me interrompa, poema,
Devido aos gritos na noite.
Não paro porque o cigarro
Me chama ao último trago.
Não paro para celebrar-te,
Não paro para suicidar-me.
Não paro, não paro,
Não paro. Persisto mais
No feito das palavras.

Não mate o seu estrambote
Com golpes da mão inútil
Que quer manusear outras coisas
Que não seja tua pena.

Enquanto a música toca
O poema se desloca
Rua abaixo, mundo à fora.
Capto-o com precisão
Sem dar trégua à minha luta,
Sem distrair-me com as mulheres
Que passam por minha janela,
Sem permitir que o sono
Fale mais alto que o Dom.
Dom down, Dom down.
Mas não me proíbas, poema,
De concluir teu destino.

______________________________

V

As palavras surgem
Em forma de lampejo.
Um termo é um relâmpago
Um verso é um clarão
E de poesia em punho
Eis o rei do trovão.

As palavras agonizam
No silêncio do olhar
Que tudo sabe, tudo vê,
Que tudo crê
Mas não materializa
Sua linguagem exercida.
Palavra não escrita
É palavra sem vida.

Que não nos ameace
Este silêncio amargo
De ter o que dizer
Sem encontrar palavras.
Nossa palavra muda,
Nosso poder castrado.



_________________________


VI

Estou sempre revendo crases
Sem saber o porquê
Estou sempre rescrevendo verbos
Sem saber pra quê
Estou sempre visitando o Aurélio
Sem saber por quê.

Mas a poesia
Brota todavia
Tal qual flor estúpida
Bela e derradeira
A cada novo dia.

E de hipérboles e metáforas,
Centomatopéias,
(Valei-me, Dorotéia!)
Vou me dando armas,
Discursos e calma
Na luta contra o vento.

Na luta com as palavras
Lavradas, vãs,
Saúdo as manhãs
E desperto as madrugadas
Sem saber que fujo
Do meu poema cujo
(Ou seria sujo?)
Único objetivo
É manter-me vivo.
Enquanto exploro a língua
Beijando a poesia,
Sobrevivo à míngua
Sem dinheiro pra vela
Que ilumina meu breu,
Sem vela pra navegar
Pelo mar Egeu.

Não sei se na verdade
Preciso navegar
Ou desvendar o mar
Na mão côncava
Sobre o meu ouvido,
Nos pungentes gemidos
Dos mortos nas enchentes.

Estou sempre conversando
Com os aedos idos
E doravante outros vates
Conversarão comigo.
E por que
Os porquês?
Porque
O verbo
A crase
Quase
Não farão sentido.

(BELLMOND, David. VIDA VIDE VERSO. Editora do autor: Vitória-ES, 1999, Páginas 73 a 78.)

LIVRO "VIDA VIDE VERSO" (PÁGINA 80)


JURAS DE AMOR NO PAPEL

A mulher olha da janela
De dentro da casa amarela,
Escrava do senhor que disse a ela :
Você vai se libertar!

Moldaram anéis de ouro,
Dois corpos livres do agouro.
Onde estão nossos tesouros
Que o papel nos prometia?

Cadê o amor fiel e forte
Que duraria até a morte?
O seu amor que me conforte,
Assinado neste juramento.

Serei seu até a morte
Ou até que morra o amor.

(BELLMOND, David. VIDA VIDE VERSO. Editora do autor: Vitória-ES, 1999, Página 80.)

LIVRO "VIDA VIDE VERSO" (PÁGINA 81)







SINCRONIA

Calo-me para te ouvir,
Falo para que me ouças
E me traduzas.
Imito o seu passo
No meu compasso.
Encaixo o meu braço
No seu abraço,
Sua sombra
Na minha imagem,
Visagem
No meu sentido.
Marchemos juntos
Na mesma ordem unida.
Cálice
Na minha tentação.
Corpo dominando corpo,
Mão alternando mão.

(BELLMOND, David. VIDA VIDE VERSO. Editora do autor: Vitória-ES, 1999, Página 81.)

LIVRO "VIDA VIDE VERSO" (PÁGINA 82)


A FOME

O rato tem fome
De queijo e o gato
Tem fome de rato.
O boi tem fome
De pasto e o homem
Tem fome de boi.
O homem tem fome
De boi e o diabo
Tem fome de homem.

(BELLMOND, David. VIDA VIDE VERSO. Editora do autor: Vitória-ES, 1999, Página 82.)